Semana turbulenta, sangrenta e resistente
A semana termina
turbulenta pelas bandas da república curitibana, umbigo do mundo. A
extraordinária repercussão do depoimento da jovem Ana Julia, 16 anos,
secundarista paranaense que ocupou escola e a tribuna da Assembleia Legislativa
paranaense na última quarta feira é o marco da semana.
Já havia me
emocionado com declarações de pessoas que foram á Tribuna da ONU manifestar
suas reivindicações e apelos aos mais diferentes tipos de tragédias pessoais e
coletivas sofridas ao redor do mundo. No entanto, Ana Julia teve um tempero
especial em sua manifestação. Sua clareza de ideias e seu equilíbrio em conter
a emoção, inclusive ao ser ameaçada pelo presidente da casa, Ademar Traiano,
são dignas de elogios e apoio. Ela reflete nas palavras e ações tudo aquilo que
um marmanjo gostaria de dizer a um parlamentar e não consegue, devido ao seu
bloqueio de autocensura, moral polida, diplomacia, ou qualquer outro
ingrediente que nos foi imposto ao longo de formação voltada para obedecer,
respeitar, honrar, aceitar.
A tentativa
fracassada do governo Temerário de mexer nas regras, conteúdos e disciplinas do
Ensino Médio sem discussão ampla com a sociedade continua a produzir efeitos
maravilhosos.
Segundo
informações oficiais do movimento Ocupa Paraná, passam de 850 as escolas e
universidades paranaenses ocupadas em todo o Estado.
Ao
mesmo tempo em que integrantes de grupos fascistas, de grupos de extrema
direita se mobilizam para criar e causar confusão e confronto, o movimento
segue firme, vencendo ameaças cotidianas, inclusive de pais e professores
contrários(as) ao ato político de tomar postura e ocupar o que já é deles(as)
por direito, o estabelecimento público escolar.
Numa
das postagens de fotos que as manifestações ocorridas durante a semana
revelaram, uma delas dizia " Não é pelo semestre. É pelos próximos 20
anos", referindo-se às consequências da recém aprovação em dois turnos da
PEC 241 na Câmara de Deputados e, agora, já em poder do Senado, para análise e
votação.
Não
bastasse esse momento de tensão, um adolescente de 16 anos é assassinado no
pátio de uma escola em Curitiba, por motivos de desavença com colega,
supostamente envolvidos com drogas, o que causa comoção em cada um(a) de nós. A
escola é símbolo e local de vida, de aprendizagem, de abertura e liberdade. Não
combina com sangue e tragédias. Ao mesmo tempo, que infelizmente esse cenário
empresta-se á essa cena, revela a crueldade e transparência da realidade da
violência e da falta de condições, valores e princípios pelos quais muitas de
nossas famílias perseguem. Cada jovem deste tem um nascedouro, um ambiente, uma
condição. Será que as políticas públicas todas deram conta de atender às suas
necessidades básicas e às de suas famílias ao longo dos tempos? Porventura o
Estado não tem responsabilidade por tal morte, como profeticamente Ana Julia
reforçou em seu pronunciamento, ao dizer que os parlamentares tinham as mãos
"manchadas de sangue" deste e de milhares de outros assassinatos a
jovens, maioria deles negros, nas periferias curitibanas?
Em
represália ao movimento, não bastassem os grupos de extrema direita e o apoio
incondicional de setores da Polícia Militar ao acobertá-los, o Governo Richa
ataca e afronta a si mesmo, pedindo reintegração de posse de algo que pertence
à sociedade, o equipamento público escolar, e que está (des)governado por ele
próprio. Ou a greve dos professores e revolta dos estudantes paranaenses são
manobra de algum partido, como ele insiste em afirmar?
Engana-se.
Felizmente a juventude está em outra frequência. Tem autonomia, autogestão,
clareza de que o modelo partidário não responde a seus anseios e de que a nova
política para enfrentar as adversidades de suas futuras gerações já está em
curso. E é agora. Nenhum governador gosta de ouvir que está sendo confrontado,
desafiado. Aliás, nenhuma autoridade. Ao não ter mais argumento, diálogo e
maturidade para a diplomacia, age com o aparato repressor. E esse é rápido,
truculento, eficaz, aterrorizante, desnecessário.
Sinto-me
reflexivo com a fala de uma mãe na manifestação da praça 19 de dezembro, na última
quinta, que afirmava nossa geração cara-pintada ser responsável pela condição
atual que estamos vivendo; E ela pedia perdão, insistindo que a juventude
fizesse do seu jeito oque precisa ser feito. São outros tempos, outras ideias,
novas formas de viver o Brasil. E isso é precioso.
As lições paranaenses e nacionais não sejam esquecidas pelas
candidaturas a prefeituras, que terão seu desfecho nesse domingo. Se a
sensibilidade de um candidato(a) não estiver sintonizada com o clamor da
maioria, já que 70% da população entrevistada já manifestou desacordo com as
medidas de congelamento de recursos públicos, segundo a pesquisa Vox Populi,
não é digno(a) ele(a) de tal posto. Até porque não é novidade caravana de
prefeitos(as) indo a Brasília reivindicar mais dinheiro para cobrir seus rombos
municipais. Uma vez decretada a PEC 241, chorarão, também eles(as), as
consequências de sua ausência de postura crítica e contrária a essa medida.
Quem viver verá. Antes, resistirá coletiva e unitariamente.
LUIS ALVES PEQUENO - professor, educador popular, empreendedor na
economia popular solidária. Curitiba/PR
*Reprodução do texto permitida, desde que citada a fonte
Com informações de http://ocupaparana.org e
http://www.brasil247.com/
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