DUAS TERESAS
Teresa Urban Foto: http://riosvivos.org.br/
Vinte e seis de março. Uma data coincidentemente marcante.
Uma passagem para a vida, uma transformação, em 2 histórias e significativas
mulheres: Teresas.
A primeira delas, cearense, religiosa na Congregação
Vicentina, enfermeira, professora, vem
para Curitiba nos anos 70 para “incomodar” seu provinciado a cumprir com o que
os Concílios de Puebla e Medellín haviam recomendado: a opção preferencial pelas
pessoas empobrecidas, como nos conta o livro Irmã Araújo Vida e Obra, organizado pela educadora popular, Ana Inês Souza(Curitiba,
Editora Gráfica Popular, CEFURIA, 2007).
Com seu tino organizativo, severo, pedagógico, humilde,
Tereza Araújo, com outras co-irmãs, fundou a primeira casa de inserção
religiosa, lá para as bandas do recém surgido bairro Boqueirão, pelos idos de
1973. Inserção de uma comunidade religiosa é uma experiência de Deus, em casa
simples da periferia, junto a pessoas simples, passando-se as mesmas privações,
como pegar ônibus distante, caro e lotado; pagar aluguel, a partir do trabalho
coletivo das irmãs; manter viva a chama da teologia encarnada na vida cotidiana
com pessoas de Bem e de poucos bens. Como também experimentei, lá para as
bandas do Xaxim e Pinheirinho.
Não é possível elencar tudo o que faltava, de tanto que
havia de motivos. No entanto, a clareza das ideias, a força da organização e a
persistência do caminhar junto com o povo de Deus, motivaram Tereza a
prosperar, a pedir ajuda, a negociar, a articular ações e pessoas, para o bem
coletivo. E isso chama-se Política. Toda e qualquer ação que vise o bem comum.
Bem diferente da política partidária em que, repugnantemente, raras exceções, o
indivíduo “se” prefere, em detrimento do que é coletivo, público.
Destaque especial seja dado ao ramo da saúde preventiva, da
comunitária troca de saberes no campo das ervas medicinais, o que desencadeou
outros elementos como a estruturação da Casa da Comunidade, Associação de
Moradores(as), Fábrica de manilhas, entre outras conquistas.
A segunda das mulheres dessa data chama-se também Teresa,
tem formação familiar rígida, de origem polaca. No entanto, sua rebeldia e
transposição também não deixaram de ser marcantes e consistentes, em tempos de
chumbo grosso, principalmente para quem se contrapunha ao regime político.
Essa excelente jornalista, ambientalista e defensora das
causas comuns e relevantes, tive o
prazer de conhecer pessoalmente na redação da extinta Folha Popular, dentro do CEFURIA, na qual ela colaborava lá pelos
idos de 1996. Trazia em si a força da ousadia, da clareza de postura, de
enfrentamento ao capitalismo avassalador, através de uma pauta simples(e
complexa): natureza e vida para todos(as). Na verdade, devido à sua sempre
incompreendida postura por familiares, empregadores e outros enojados(as) de
ideias marxistas, julgadas erroneamente dispensáveis, Teresa Urban, ao não
conseguir vagas em jornais, após suas recorrentes prisões, pautou a água limpa
e o tema ambiental como sendo foco de seus serviços, a partir do que sempre
gostou de fazer: escrever.
A estratégia deu tão certo que ela pode atender pedidos de
Estadão, O Globo e Veja, entre outros órgãos de imprensa, sempre sem perder de
vista sua envolvente e imprescindível relação com as lutas do povo, com as
causas mais sérias, como as que estão na entrevista à Gazeta do Povo, em 16 de
julho de 2011. http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/especiais/entrevistas/teresa-a-batista-0hdpd884kac8arib3napa1s9a.
E onde essas duas mulheres de fibra convergem? Digo já. Após
intervenção de Dom Pedro Fedalto para a transferência da Teresa de uma
penitenciária para o Convento das irmãs vicentinas, no Bairro Mercês, em
Curitiba, a pedido e intermediação da Irmã Araújo, que já a conhecia.
Ambas se aproximam, se afinam nas ideias e se
concretiza, num encontro, a "Páscoa", a passagem. Teresa desfalecida, vê Tereza
reconfortante. E a caminhada segue, e a luta de ambas continua, sem que uma
sobreponha a outra. Só se complementam. Se complementam até nas datas. A Urban nasce na mesma data em que a Araújo
desencarna.
Ambas se afinam na visão de mundo, de rompimento com o jeito
das coisas serem, sempre da mesma forma. Na cabeça de Araújo, fazerem de Urban
uma prisioneira, em condições de saúde paupérrimas, é uma condição
inadmissível. E, simplesmente por pensar a Liberdade, a Democracia, a ruptura
com o “Diga que eu obedeço”,
Dito isto, em tempos difíceis do atual cenário político
nacional, fica nítida a esperança, a garra, a sapiência, a perseverança que vem
da Mulher. Num paralelo com a passagem da morte para a vida que, cristãos(ãs),
celebramos, fica a dica límpida e transparente: Não fosse a luta das gentes,
nada teríamos conquistado no campo dos direitos básicos, incluindo os
constitucionais. E é com muita luta, resistência e inspiração de quem nos
precedeu e ensinou alguns exemplos, que devemos perseverar.
Hoje, faria 70 anos a Teresa das letras. A Tereza das ervas, há
35 anos nos acompanha num plano superior ao nosso. Vivam sempre conosco!
Veja mais
Tereza Araújo Foto http://cefuria.org.br/
http://www.cefuria.org.br/2012/06/22/ir-tereza-araujo-construindo-um-caminho-novo/
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